Eu não conseguia dormir. Os pensamentos perturbavam e atordoavam a minha alma perpétuamente perdida. Tu dormias profundamente a meu lado, pois ao fim de muitas horas, finalmente adormeceste….
“Sei bem que quando acordares não vais saber onde estás e não reconhecerás esta casa que agora habitamos para tu poderes ter o máximo descanso possível.
Mas não faz mal, eu estarei sempre aqui ao teu lado.
A cada dia que passa, tu perdes mais memórias…. Esqueceste-te da nossa casa antiga, dos nossos filhos, da nossa história, da nossa família, da tua idade, de quem és e do teu passado. Todos os dias fazemos a mesma rotina, e todos os dias me fazes as mesmas perguntas. É como se voltasses a experimentar as mesmas coisas todos os dias, e aceitasses vezes e vezes sem conta o que está neste momento a acontecer.
Gostava de te poder dizer que estás a melhorar, que isto é uma fase e que posteriormente vai ficar tudo bem, mas não consigo mentir-te. Nunca consegui. Sou uma péssima mentirosa. E embora sussurre todos os dias ao teu ouvido o amo-te mais sincero deste mundo, sei que não é suficiente. Nenhuma palavra poderá tornar isto mais leve. Porém, espero que esse amo-te, consiga acalmar a grande confusão interna que bem sei que habita em ti.
Sinto cada vez mais que preciso que não te esqueças, mas nunca te poderei pedir isso. Se fizesse isso, seria tudo, menos justo.
Os médicos dizem que estamos no pico do problema, e assim que acordares não te lembrarás de absolutamente nada: nem de mim, nem de nós, nem de quem és e muito menos do que foste. Por isso é que só agora escrevo esta angústia. Tenho medo que não voltes para mim. E se algum dia leres estas palavras, se algum dia te voltares a lembrar de mim, quero que saibas que tu foste o meu grande amor e que eu te amei perdidamente. Que foste sempre o melhor marido do mundo e que fizeste de mim, a mulher mais feliz do mundo.
Quando acordares, meu amor, não te lembrarás de tudo e de nada. Acordarás com esses olhos da tonalidade do pôr-do-sol, aquele alaranjado com alguns pontos amarelos e castanhos pelo meio, com um brilho único e genuíno – nem sei como descrever- talvez até fiques assustado, não me reconheças e fiques alarmado, mas eu irei consolar-te, explicar-te quem sou, talvez até mostrar-te algumas fotografias que imprimimos e emolduramos juntos. Talvez até consiga arrancar-te um sorriso quando te contar os nossos dias juntos, e esboçarei discretamente também um, quando lembrar-me daqueles beijos quentes e intensos, mas sei que esses, eu não vou poder contar-te, tal como as nossas brincadeiras mais secretas e inesquecíveis. Tudo ficará guardado em nós, porque mesmo que não te lembres fisicamente, eu sei que o teu coração nunca irá esquecer.”
Olho à minha volta. Sinto que te começas a mexer. Abres os olhos. Olhas para mim. Esboças um sorriso e dizes:
-Eu tenho a mulher mais linda deste mundo.
Eu sabia que nunca te irias esquecer.
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